domingo, 25 de junho de 2017

Festival que nasceu morto chega aos 70 em boa forma (Sara Silva)


Apesar da revolução da internet, o cinema continua a influenciar outra mídias

Poucos eventos possuem importância internacional a ponto de atrair a atenção e estimular o imaginário da aldeia global. No mês passado foi a vez da cerimônia anual do Oscar em Hollywood, em Los Angeles, sempre produzindo fotos, fofocas, protestos, polêmicas em torno de filmes e personalidades do cinema. No mês de maio será a vez do Festival de Cannes, na França, que comemora seus 70 anos, também servindo para alimentar e amplificar o mundo da sétima arte.

O festival francês, porém, nasceu morto.

A idéia de realizar um festival de cinema na França apareceu antes da Segunda Guerra, quando intelectuais e artistas mostraram-se indignados com a censura no Festival de Veneza de 1937, na Itália dominada por Benito Mussoline, evento inaugurado por nada mais nada menos do que Joseph Goebbels, o ministro da propaganda do nazismo.

Um projeto foi apresentado ao então ministro da Educação e Belas Artes da França, uma cidade foi selecionada entre diversas interessadas, o próprio inventor do cinema Luis Lumiére foi convidado em junho de 1939 e aceitou ser o presidente do Festival, previsto para acontecer em novembro do mesmo ano.

Os EUA e a Inglaterra apoiaram a iniciativa daquele que deveria ser um festival de cinema do « mundo livre ». O cartaz foi criado por um famoso pintor francês, Jean-Gabriel Domergue. Um dos maiores estúdios de cinema, a MGM, fretou um navio para desembarcar em Cannes com estrelas de filmes como “O Magico de Óz”.

Mas no dia 1° de setembro de 1939, dia de abertura do festival, as tropas nazistas invadiram a Polônia. E a festa foi anulada antes de começar.

Somente depois da II Guerra Mundial, em 1946, um dos organizadores da primeira edição anulada, Philippe Erlanger, conseguiu realizar em Cannes a primeira edição do festival.

Outro festival seria cancelado em 1968, mesmo depois de começado, em meio às revoltas estudantis que marcaram aquele ano, o que faz com que o aniversário de 70 anos seja comemorado neste 2017.

Apenas uma Guerra Mundial e os protestos de 1968 conseguiram adiar ou anular uma edição do mais badalado festival de cinema do planeta. O sucesso do evento tem sido tanto que a partir dele nasceram diversas outras mostras paralelas como a Quinzena dos Realizadores, a Semana da Crítica e o Mercado do Cinema. O cineasta brasileiro Kleber Mendonça Filho, que realizou o filme Aquarius, será o presidente do júri na Semana da Crítica.

A edição deste ano do Festival de Cannes acontece entre 17 e 28 de maio e tem como presidente o cineasta espanhol Pedro Almodóvar, que já teve cinco filmes selecionados na história do evento.

Em meio à uma das maiores revoluções tecnológicas da história, cada edição do Festival de Cannes é um teste para a indústria do cinema. O Século XX ficou marcado como o Século do Cinema. Nenhum outro formato de mídia foi tão global e influenciou tanto a vida do homem naquela era. Nações passaram a ser identificadas pelas características ou estilo de seus cineastas, o cinema italiano, o sueco, o francês… o cinema novo no Brasil, o cinema soviético…

Pode ser que este Século XXI fique marcado como o século da pulverização da mídia. Mas ainda não apareceu nada que ameace ou que supere o formato cinema. E muito muito menos em conteúdo. O cinema reúne todas as artes, da literatura à fotograria, do teatro à música, da cenografia à dança,

Alguns países não viveram a idade do cinema, outros viveram pouco.

Anos atrás a Califórnia foi notícia por causa do impacto na economia local de uma greve de roteiristas, algo impensável nos outros países do globo. Na França o cinema é uma verdadeira religião, com diversos palácios dedicados a esta arte, como o Fórum das Images e a Cinemateca Francesa, além de diversos festivais.

O brasileiro Carlos Saldanha, nascido no Rio de Janeiro, conquistou seu espaço na indústria do cinema, conseguindo realizar alguns dos filmes de animação de maior sucesso nos últimos tempos, entre os quais A Idade do Gelo e Rio. Ele teve a sorte de conseguir estudar animação em New York. Se estivesse morando no Rio de Janeiro, talvez tivesse que vender latas de cerveja nas ruas nos dias de carnaval. Como em outros setores da economia, a indústria do cinema é concentrada em alguns poucos locais.

Mas apesar da revolução da internet, o cinema continua a alimentar e influenciar outras mídias, pois ainda não inventaram um meio capaz de concentrar tanto conteúdo em forma de arte quanto um… filme.

Sara Silva, jornalista, DM OPINIÃO

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