sábado, 6 de abril de 2013

Comissões ou barricadas?


O deputado Marco Feliciano não é o único parlamentar no lugar errado. Ele causa escândalo na Comissão de Direitos Humanos e Minorias por razões óbvias e chama muita atenção por ser caricato e histriônico. Mas é também um despropósito o senador Blairo Maggi na Comissão de Meio Ambiente ou parlamentares réus na Comissão de Constituição e Justiça.

O que aconteceu é que as comissões deixaram de representar os interesses daqueles que deveriam estar representados e passaram a ser barricadas tomadas de assalto pelos que são contrários aos interesses defendidos.

O senador Blairo Maggi, desde que foi acusado de ser “estuprador da floresta” pela imprensa estrangeira, tem lutado contra o estigma de desmatador. No seu governo houve avanços, mas ao mesmo tempo ações do Ministério Público mostraram que ele manteve áreas de sombra.

Comemore-se o avanço pragmático do senador, mas não há mágica transformista que o faça um ambientalista. Também causa estranheza a presença na comissão dos fazendeiros Kátia Abreu e Ivo Cassol.

Por que Maggi quis ser presidente da Comissão de Meio Ambiente e os outros, integrantes? Para melhor impedir qualquer avanço ambientalista que contrarie os interesses daqueles que realmente defendem e que são o grupo ao qual pertencem: os ruralistas.

O mesmo acontece com pessoas que estão hoje respondendo a processos na Justiça, ou já são réus condenados, e querem assento na Comissão de Constituição de Justiça, como José Genoino, João Paulo Cunha, Eduardo Cunha, e o nome que parece brincadeira de mau gosto: Paulo Maluf.

O deputado Feliciano diz que os negros são amaldiçoados. Essa afirmação, pelas leis brasileiras de um estado laico, é crime de racismo. Ele deveria estar respondendo por isso. A intolerância militante que pratica contra os homossexuais faz dele uma pessoa totalmente errada para estar numa comissão cujo nome é Direitos Humanos e Minorias.
A imprensa se refere a ele como “pastor”. Há pastores e pastores. Hoje, evangélicos e protestantes são 22% da população brasileira e evidentemente só um grupo minoritário pensa como ele. Para as denominações que vieram da Reforma de Lutero, no século XVI, o posto de pastor se atinge após um difícil e longo curso de teologia nos seminários, em que as interpretações da Bíblia passam por várias disciplinas, inclusive comparações com textos antigos em grego, hebraico e latim.

As novas denominações religiosas evangélicas, pentecostais ou não, têm níveis de formação diferenciados com mais ou menos teoria. Alguns bem improvisados. Mas os que têm aparecido com mais destaque na imprensa são os grupos que cometem erros como os da exploração da fé dos mais pobres, ou os que fazem sustentações doutrinárias controversas.

Quem os iguala a todos não compreenderá o movimento da sociedade brasileira no qual o catolicismo perdeu 10 pontos percentuais de fiéis a cada década nos últimos 20 anos. Essa tendência de redução tem sido consistente desde os anos 1970. O próprio catolicismo vive imerso em ideias ultrapassadas como a da negação de controle da natalidade, mesmo por métodos de proteção da saúde, como a camisinha.

As religiões precisam se modernizar de forma geral. Mas as denominações protestantes tradicionais, e os evangélicos que não comungam com as ideias do deputado Feliciano, têm dado pouca ênfase à necessária separação entre joio e trigo.

O debate laico, que é o que interessa à coluna, deve se centrar na tomada de assalto das comissões por parlamentares que são contrários aos interesses representados. Isso é uma distorção e enfraquecerá as funções do Parlamento. Ele existe para que os debates setoriais possam ser realizados de forma democrática e com os interesses sendo representados nas comissões certas.


De Miriam Leitão, jornal O GLOBO

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